Desvios Teológicos na Modernidade

Leitura bíblica: 2 Timóteo 4.1-5

“Conjuro-te, pois, diante de Deus, e do Senhor Jesus Cristo, que há de julgar os vivos e os mortos, na sua vinda e no seu reino, que pregues a palavra, instes a tempo e fora de tempo, redarguas, repreendas, exortes, com toda a longanimidade e doutrina. Porque virá tempo em que não suportarão a sã doutrina; mas, tendo comichão nos ouvidos, amontoarão para si doutores conforme as suas próprias concupiscências; e desviarão os ouvidos da verdade, voltando às fábulas. Mas tu, sê sóbrio em tudo, sofre as aflições, faze a obra de um evangelista, cumpre o teu ministério”.

INTRODUÇÃO

Neste estudo discorreremos sobre desvios teológicos que surgem “entre nós” (At 20.27-30; 2Pe 2.1,2; Gl 5.20), isto é, as doutrinas falsificadas – não confunda com doutrinas falsas!

Segundo a Bíblia, todas as doutrinas precisam ser identificadas de acordo com a sua origem, que pode ser:

a) divina (At 20.27; Gl 1.8-12; 1Pe 1.24,25; 1Tm 1.10; Tt 2.1);

b) humana (Is 29.13; Mt 16.6; Cl 2.20-22; Mt 23.24); ou

c) diabólica (1Tm 4.1-3; Tg 3.15; Dt 13.1-4; Mt 7.21-23).

I – OS AVISOS DA BÍBLIA QUANTO AOS FALSIFICADORES DA PALAVRA

1. Existem muitos falsificadores da Palavra (2Co 2.17):

a) Falsos cristos e anticristos, isto é, precursores do Anticristo (Mt 24.24a; Mc 13.22a.; 1Jo 2.18,19; 2 Jo v.7).

b) Falsos cientistas, propagadores da falsamente chamada ciência (1Tm 6.20,21; 2Co 4.4; Sl 10.4).

c) Falsos irmãos (1Co 5.11; 2Co 11.15,24-28; Gl 2.3,4; Tg 1.26; Rm 16.17,18).

d) Falsos adoradores (Mt 15.7-9; Jo 4.23,24).

e) Pseudopastores e apóstolos enganadores (2Co 11.5,13; Ez 34.1-10).

f) Falsos profetas (gr. pseudoprophetes), precursores do Falso Profeta (Mt 7.15-23; 24.11,24; Mc 13.22; At 13.6; 2Pe 2.1; 1Jo 4.1).

g) Milagreiros (Mt 24.24b; Mc 13.22b; 2Co 11.13-15).

h) Falsos mestres (ou teólogos), que atuam “entre nós” (2Tm 4.1-5; 2Pe 2.1,2; 3.16).

2. De acordo com as palavras de Jesus em Mt 7.15-23, as características dos falsificadores da Palavra são as seguintes:

a) Parecem-se com ovelhas; mas são lobos devoradores (v. 15; At 20.29; Mt 23.28; Gl 2.6).

b) Seus frutos são maus (vv. 16-20; Mt 3.10; Jd v.12).

c) Dizem-se servos de Deus (vv. 21,22; 2Ts 3.6; Ap 2.20,21).

d) Não fazem a vontade do Senhor (v. 21; Jo 7.16,17). Mesmo sem perceberem (Mt 7.22; Ap 3.1), obedecem à sua própria vontade (Ez 13.2; 2Tm 4.10; Lc 9.23), à do povo (Êx 32.1-4,19,20; Gl 1.10) ou, em última instância, à do Diabo (Jo 8.44; 1Tm 4.1-3); e rejeitam a vontade de Deus (Rm 12.2; 1Jo 2.17).

e) São muitos (v. 22; 2Co 2.17; 2Tm 4.3; Mt 24.1-12; Fp 3.18).

f) Usam o nome do Senhor (v. 22; 2Tm 2.19).

g) Profetizam (v. 22). Os falsos profetas também são “profetas” (Jr 14.14; 28.5; 1Rs 13; 22.1-28; Ez 13.1-4); por isso, profetizam!

h) Expulsam demônios e fazem muitas maravilhas (v. 22).

i) Deus não os conhece (v. 23) — gr. ginõskõ (cf. Rm 7.15). Ele nunca aprovou, reconheceu ou deu crédito ao trabalho deles. O Senhor só tem relacionamento aprovador com quem o ama e o serve (Gn 18.19; Sl 1.6; Jo 10.14,27; 1Co 8.3; Na 1.7; Gl 4.9).

j) Praticam iniquidade (v. 23; 2Pe 2.20-22). Isso implica rejeição consciente da Palavra de Deus (Mt 13.41; 23.25,28; 24.12).

k) Não entrarão no Reino de Deus (vv. 19,21,22; 2Pe 2.1,20-22; Jo 15.6).

II – DESVIOS TEOLÓGICOS BASEADOS NA FILOSOFIA PÓS-MODERNA

1. Pós-modernidade

Pós-modernidade é o termo usado para definir o atual sistema que predomina no mundo, relacionado com as tendências gerais que abarcam as esferas política, econômica, social e religiosa. Os tempos pós-modernos estão relacionados com os “tempos trabalhosos” mencionados na Palavra de Deus (2Tm 3.1-5).

2. Pós-modernismo

Pós-modernismo é a corrente que, nas artes, literatura, arquitetura, filosofia e ciências humanas, defende a validade dos princípios pós-modernos. Nesse tempo do fim predomina na sociedade atual várias filosofias humanistas, contrárias à sã doutrina:

a) Antropocentrismo — culto ao ser humano (Sl 82.6; 2Pe 1.4-9).

b) Racionalismo — culto à razão (1Co 2.14-16).

c) Hedonismo — culto ao prazer carnal (Sl 1.1-3).

d) Narcisismo — culto ao eu; egocentrismo, egotismo (Gl 2.20; Lc 3.30; 9.23).

e) Materialismo — culto aos bens materiais; amor às riquezas (Lc 12.16-20; 1Tm 6.9,10; Ef 5.5).

f) Secularismo — culto ao mundo; mundanismo (1Jo 2.15-17; Tg 4.4; 2Tm 4.10; 2Co 4.4).

g) Relativismo — nessa filosofia, não há lugar para os conceitos absolutos de verdade, dignidade, moral, ética e fé em Deus (Is 5.20; Gn 19; Lc 17).

h) Liberarismo — sobretudo o teológico (1Tm 4.1; 2Tm 4.1-5; At 20.27-30; 2Pe 2.1,2), mas também o eclesiástico e o consuetudinário.

III – DESVIOS TEOLÓGICOS DECORRENTES DE FALSOS SINAIS

Existe, nesses últimos dias, um “outro evangelho” (cf. 2Co 11.4; Gl 1.8) que prioriza “milagres”, em detrimento da exposição da Palavra de Deus (1Co 1.22,23; Jo 4.48; 10.41; Mc 16.15-20).

As doutrinas e práticas relacionadas com esse “evangelho” surgem depois de experiências exóticas. Seus propagadores dizem ter “novas unções”, supostamente baseadas na Bíblia, como: “unção da loucura de Deus” (1Co 1.25), “unção dos quatro seres” (Ap 4), “unção do riso” (Gn 18.15), etc. Mas só existe uma unção verdadeira, a do Espírito Santo (1Jo 2.20,27; Lc 4.18; At 10.38; 2Co 1.21).

Alguns defensores desse “outro evangelho”, dizendo ter acesso à Sala das Escrituras, à Sala dos Projetos e à Sala dos Tempos, têm mandado o povo guardar a Bíblia e “mergulhar de cabeça” nas novas revelações “divinas” (1Co 15.3,4; Sl 119.89,105; Dt 17.19). Outros enfatizam o antibíblico culto aos anjos, ainda que de forma indireta (Cl 2.18; Hb 1.14; Êx 33.2; Dn 6.22; Lc 1.19; At 12.11; 27.23). As mensagens angelicais são consideradas equivalentes ou superiores à Palavra de Deus (Jo 12.28-30; Gl 1.8; 1Rs 13.18).

Muitos desses enganadores têm chamado os crentes equilibrados – que crêem no sobrenatural, mas consideram a Bíblia a sua regra de fé, de prática e de viver – de fundamentalistas e bibliólatras. Mas as Escrituras devem, sim, controlar todo o nosso viver (Sl 119.9,11; Jo 17.17; 2Tm 3.16,17).

IV – DESVIOS TEOLÓGICOS DECORRENTES DO MAU USO DOS DONS ESPIRITUAIS

1. Dons Ministeriais.

De acordo com 1 Coríntios 12.28, há uma hierarquização dos dons espirituais feita por Deus, que realiza todas as coisas com ordem (Gn 1; Nm 2; 1Co 14.26,40; 15.23; 1Ts 4.16,17; 5.23; Cl 2.5). Essa hierarquização existe, não para que um portador de certo dom se considere superior aos outros, e sim para que haja ordem na casa do Senhor.

a) Primeiro: apóstolos (1Co 12.28; Ef 4.11). São homens de Deus, enviados por Ele, com grande autoridade, e não autoritarismo. Formam a liderança maior da igreja, independentemente dos títulos usados pelas igrejas locais (pastores presidentes, bispos, pastores, etc.), pois os dons vêm do Espírito, e o título é recebido pelos homens.

b) Segundo: profetas (1Co 12.28; Ef 4.11). Nesse caso, são pregadores (pregadores, mesmo!) da Palavra de Deus, portadores de mensagens proféticas.

c) Terceiro: doutores (1Co 12.28; At 13.1). Atuam juntamente com os profetas e são ensinadores da Palavra de Deus.

d) Há casos, como o de Paulo, em que três ou dois dos ministérios mencionados (apóstolo, profeta e doutor) se combinam (1Tm 2.7). Os ministérios de pastor e evangelista (cf. Ef 4.11) certamente fazem parte desses três primeiros itens mencionados em 1 Coríntios 12.28, posto que são títulos relacionados com a liderança maior da igreja.

e) Depois: milagres (1Co 12.28; Mc 16.17; Jo 10.41).

f) Depois: dons de curar, socorros, governos (líderes de grupos menores diversos), variedades de línguas (1Co 12.28).

2. Dons de Poder

Os dons de poder são operações extraordinárias realizadas pelo Espírito Santo. O Senhor cura e faz prodígios, hoje, pois não mudou (Hb 13.8). Mas somente Ele faz milagres, de fato (Êx 3.20; 7.3,4; Jl 2.30; Hb 2.4), com as seguintes finalidades:

a) Autenticar, confirmar e comprovar a pregação do evangelho (Mc 16.15-20; Dt 29.3; Hc 2.4).

b) Manifestar a glória do Senhor e levar o povo a crer mais e mais em Jesus, dando cumprimento à Palavra profética (Jo 2.11; Mt 8.17; Êx 8.16-19; Jo 9.1-25; At 3.1-16; 9.36-43; 13.6-12; 14.8-13).

c) Desfazer as obras do Diabo (1Jo 3.8; Lc 13.16; At 10.38).

d) Honrar os verdadeiros servos de Deus (Nm 16.28-32; 1Rs 17.22; 18.38; 2Rs 6.5).

3. Existem falsos milagres

a) Certos fenômenos têm causado muitas divergências no meio do povo de Deus. Não são obras divinas como batismos com o Espírito Santo, curas, ressurreições e livramentos (Mc 16.15-20; At 2.4; 10.46; 19.6; 1Co 12-14; At 5.15,16; 16.18; 19.11,12; 3.1-7; 8.7; 9.33,34; 14.8-10; 28.3-8). São fenômenos, manifestações exóticas, estranhas, aberrantes, que geram muita confusão.

b) Os dons de curar são operações multiformes do Espírito Santo, e não invenções dos criativos milagreiros. Deus age como quer. Quando Ananias visitou a Saulo, que estava cego, tão-somente impôs-lhe as mãos, e caíram dos olhos do apóstolo algo semelhante a escamas (At 9.17-18). Houve um sinal visível da cura, porém Ananias não precisou empregar um método exótico.

c) Os propagadores de certos fenômenos não são pessoas santas e humildes, mas avarentas, antiéticas, ameaçadoras, interesseiras e propagadoras de heresias.

d) Aprendamos com o Senhor Jesus (Mt 11.29; 1Jo 2.6), que jamais fez propaganda dos autênticos milagres que realizava.

e) Como já vimos, os sinais, prodígios e maravilhas podem ter três origens: divina (Êx 7.3,4; Jó 9.10; Sl 96.3; At 10.38); humana, no caso de artes mágicas, ilusionismo, simulações, truques; e diabólica, mediante sinais e prodígios de mentira (2Ts 2.9-11; 1Jo 2.18; 4.1).

4. Julgando todas as coisas

Não há dúvidas, à luz da Bíblia, de que o Diabo realiza sinais e prodígios de mentira para enganar aqueles que carecem de discernimento espiritual (Mt 7.22; 2Co 11.13-15; Êx 7.11,12; 8.18,19).

Devemos julgar os “milagres”, pois somente a Palavra de Deus dispensa qualquer comentário (Sl 19.7; 18.30; 2Sm 22.31; Sl 119.140; Pv 30.5).

5. Todas e quaisquer manifestações devem ser examinadas:

a) Quais são os seus propósitos?

b) Resultam elas em maior glória a Deus e vidas mais santas?

c) Atraem os perdidos a Cristo?

d) Ou deixam os crentes cada vez mais confusos e sem desejo de estudar as Escrituras?

6. Passagens bíblicas que não apóiam certos “milagres” da atualidade e falsas doutrinas decorrentes deles:

a) “Eis que faço uma coisa nova, agora sairá à luz; porventura não a percebeis? Eis que porei um caminho no deserto, e rios no ermo” (Is 43.19). Os milagreiros chamam os seus sinais de “coisa nova”. Mas a profecia contida neste versículo é específica.

b) “Na verdade, na verdade vos digo que aquele que crê em mim também fará as obras que eu faço, e as fará maiores do que estas, porque eu vou para meu Pai” (Jo 14.12). Esta passagem, que é a preferida dos milagreiros, não apóia qualquer manifestação exótica. As “obras maiores” dizem respeito à quantidade e ao alcance, e não à qualidade das obras realizadas. São maiores, não em seu valor intrínseco, ou em sua glória, mas no objetivo. Os discípulos do Senhor fariam as obras de Deus numa escala mais ampla. Refere-se, sobretudo, a milhões de almas salvas (Jo 10.16; 11.52; 12.32), e não a fenômenos que confundem o povo de Deus.

c) “Vede, pois, que não venha sobre vós o que está dito nos profetas: Vede, ó desprezadores, e espantai-vos e desaparecei; porque opero uma obra em vossos dias, obra tal que não crereis, se alguém vo-la contar” (At 13.40,41). Nesta passagem, “obra tal que não crereis se alguém vo-la contar” é uma profecia relacionada com o reino de Judá, devastado pela Babilônia, em 586 a.C. (cf. Hc 1.5).

d) “Porque a loucura de Deus é mais sábia do que os homens; e a fraqueza de Deus é mais forte do que os homens” (1Co 1.25). Como vimos, a expressão “loucura de Deus” foi empregada em conexão com outra — “fraqueza de Deus” — para enfatizar o quanto o Senhor é superior a cada um de nós.

e) “Mas, como está escrito: As coisas que o olho não viu, e o ouvido não ouviu, e não subiram ao coração do homem, são as que Deus preparou para os que o amam” (1Co 2.9). Estas “coisas” mencionadas não são milagres, e sim as glórias indizíveis do evangelho, desfrutadas em parte na terra (Rm 8.18; 1Pe 5.1).

f) “O qual nos fez também capazes de ser ministros de um novo testamento, não da letra, mas do espírito; porque a letra mata e o espírito vivifica” (2Co 3.6). A letra que mata não é a Palavra de Deus, viva e eficaz (Hb 4.12), e sim a lei mosaica (2Co 3.7), haja vista sermos vivificados pela graça de Deus.

7. Muitos fenômenos propagados por milagreiros têm ocorrido também entre muçulmanos, hindus, espíritas de várias ramificações e católicos romanos.

Por que Deus tolera a ocorrência de falsos sinais no meio do seu povo? Para provar o nosso amor para com Ele, demonstrado pela fidelidade à sua Palavra (Mt 11.11; Jo 10.41; Dt 13.1-4; Jo 14.23).

Embora Deus realize milagres, em decorrência da pregação do verdadeiro evangelho, nem todos os sinais, prodígios e maravilhas provêem dEle (Mc 16.17,18; 1Rs 19.8-12; Mt 24.24; Ap 13.11-18; Mt 7.21-23).

Por Ciro Sanches Zibordi (Semana Teológica 2009, 2 e 3 de Dezembro)

Nenhum comentário:

Postar um comentário