A Supremacia da Bíblia ante a Teologia Moderna

Leitura bíblica: 1 Coríntios 4.6

“E eu, irmãos, apliquei estas coisas, por semelhança, a mim e a Apolo, por amor de vós; para que em nós aprendais a não ir além do que está escrito, não vos ensoberbecendo a favor de um contra outro”.

INTRODUÇÃO

Neste estudo, veremos que a Bíblia, a Palavra de Deus, deve ser a fonte primária, precípua, primacial da teologia. Ela tem o primado, está em primeiro lugar, tem prioridade, primazia, excelência, superioridade, preeminência. É a nossa fonte principal de autoridade (Gl 1.8; Sl 138.2, ARA; 119.105).

I – FONTES TEOLÓGICAS SECUNDÁRIAS

1. Razão: Não tem o primado porque a fé no que dizem as Escrituras precede a razão (1Co 2.14,15; Mt 11.25; Sl 25.14). Em boa parte do protestantismo, o racionalismo tem ocupado o centro do palco. Liberalismo e modernismo são termos cunhados para descrever a equivocada insistência no primado da razão.

2. Tradições: Estas são importantes, mas não primazes. A posição oficial e histórica do romanismo tem sido a de fazer a tradição papal o supremo tribunal de recursos. O que a Bíblia ensina sobre Maria, por exemplo, é interpretado de acordo com o modo como a Igreja Católica Romana a tem visto tradicionalmente.

3. Teólogos: A teologia não é a fonte primária de autoridade; antes, é o que os teólogos (falíveis) dizem da inerrante e infalível Palavra de Deus.

4. Pais da Igreja: Esta fonte é importante, mas não decisiva como as Escrituras, o supremo tribunal de recursos. Não é a Igreja que determina o que a Bíblia ensina, e sim a Bíblia que determina o que a Igreja ensina.

5. Experiências e milagres: O estudante pentecostal da Palavra de Deus deve valorizar as experiências e os milagres, mas não priorizá-los (2Co 12.1-4 com 1Co 15.1-4). A experiência pessoal deve ser interpretada à luz das Escrituras, e não o inverso. Na hierarquização feita por Deus, a sua Palavra tem o primado em relação a milagres, dons de curar e outras manifestações (1Co 12.28; Jo 10.41; Dt 13.1-4; Ap 2.20-22).

II – A SUPREMACIA DAS ESCRITURAS E A TEOLOGIA EXEGÉTICA

1. Como alcançar a Correta Interpretação das Escrituras

Para as Escrituras serem primazes no estudo teológico, elas precisam ser interpretadas corretamente. Daí a necessidade da Teologia Exegética — formada principalmente pelas matérias Hermenêutica e Exegese, necessárias para a compreensão de passagens difíceis de entender (2Pe 3.16,18) e para a interpretação geral da Bíblia (Ne 8.8; At 17.11).

Como um departamento da Teologia, ela enfatiza o emprego dos princípios hermenêuticos, a fim de extrair dos textos sagrados a sua verdadeira significação.

2. A Teologia Exegética

A Teologia Exegética se ocupa do sentido primário e literal do texto e pressupõe conhecimento das seguintes matérias:

a) Filologia Sagrada. Estudo das línguas originais: hebraico, aramaico e grego. Como fazer exegese, isto é, interpretar a Bíblia corretamente, sem o conhecimento (ainda que nocional) dessa matéria?

b) Introdução Bíblica. Ou Bibliologia. Estudo que abarca geografia, cenário histórico, usos, costumes e práticas dos povos bíblicos, etc.

c) Teologia Histórica. Estudo que se ocupa do desenvolvimento teológico ao longo do tempo. Afinal, as doutrinas bíblicas já foram exaustivamente debatidas pelos teólogos do passado.

d) Teologia Bíblica. Estudo da Bíblia livro por livro, capítulo por capítulo, versículo por versículo, oração por oração, frase por frase, palavra por palavra.

e) Teologia Sistemática. Estudo da Bíblia de maneira compendiada, sistematizada. Teologia Bíblica e Teologia Sistemática devem se completar. Essa matéria não se ocupa do exercício filosófico, como muitos pensam, mas do agrupamento das doutrinas bíblicas a nós reveladas pelo Espírito Santo, mediante o estudo da Palavra de Deus.

f) Teologia Prática. Envolve matérias ligadas à prática cristã, como Evangelismo, Homilética, Ministério Cristão, Práticas Litúrgicas, etc.

3. Hermenêutica

Hermenêutica (gr. hermeneuein) é a arte e a ciência de interpretar textos. O termo deriva de Hermes (Mercúrio), filho de Zeus (Júpiter) e mensageiro dos deuses, segundo a mitologia greco-romana. Era considerado o deus da ciência, da interpretação e da eloquência (cf. At 14.12).

A Hermenêutica Bíblica abarca métodos e técnicas pelos quais podemos, com a iluminação do Espírito Santo (1Co 2.9,10), interpretar as Escrituras corretamente.

4. O Objetivo da Hermenêutica

O objetivo primário da Hermenêutica é estabelecer princípios gerais de interpretação para se entender o verdadeiro sentido dos autores ao redigirem as Escrituras. Nesse caso, ela serve a Exegese. Não é possível fazer exegese dos textos bíblicos sem a aplicação dos princípios de interpretação, conhecidos mediante o estudo da Hermenêutica.

5. Manejar bem a Palavra da Verdade

É um dever do estudioso da Bíblia e da teologia manejar bem a Palavra da verdade (Mt 22.29; At 17.10,11; 2Tm 2.15). O salvo recebeu a responsabilidade de interpretar corretamente as Escrituras (Mt 13.11). E somente o servo do Senhor, pelo Espírito, está apto a interpretar a Bíblia Sagrada de modo correto (Mt 11.25; Jo 14.26; 1Co 2.9,10; 1Jo 2.20,27; 1Co 2.11-16).

III – A SUPREMACIA DAS ESCRITURAS E OS PRINCÍPIOS DA HERMENÊUTICA

Princípios gerais de interpretação da Bíblia:

1. A Bíblia, como Palavra de Deus, é infalível e inerrante (2Pe 1.20,21; 2Tm 3.16,17).

A mensagem central da Bíblia é a salvação (Jo 3.16; Rm 3.23; 6.23 etc.), mas ela possui passagens difíceis de entender (Dt 29.29; Sl 145.3; Ez 14.23; Rm 11.33,34; 1Co 13.12; 2Pe 3.16), as quais precisam ser interpretadas levando-se em conta o princípio em apreço.

2. A Bíblia interpreta a própria Bíblia.

Cada texto deve ser analisado à luz do contexto.

a) Há seis tipos de contexto: geral (a Bíblia é análoga); imediato (fica imediatamente antes e depois da passagem estudada); remoto; referencial (paralelismo); histórico-cultural; literário (estuda a Bíblia quanto ao gênero literário).

b) Textos bíblicos para demonstração do princípio em análise:

  • “E saiu Caim de diante da face do Senhor, e habitou na terra de Node, do lado oriental do Éden. E conheceu Caim a sua mulher, e ela concebeu, e deu à luz a Enoque; e ele edificou uma cidade, e chamou o nome da cidade conforme o nome de seu filho Enoque” (Gn 4.16,17).
  • “Viram os filhos de Deus que as filhas dos homens eram formosas; e tomaram para si mulheres de todas as que escolheram” (Gn 6.2).
  • “Lembra-te do dia do sábado, para o santificar” (Êx 20.8).
  • “Segundo o número dos dias em que espiastes esta terra, quarenta dias, cada dia representando um ano, levareis sobre vós as vossas iniqüidades quarenta anos, e conhecereis o meu afastamento” (Nm 14.34).
  • “No seu pescoço reside a força; diante dele até a tristeza salta de prazer” (Jó 41.22).
  • “Não removas os antigos limites que teus pais fizeram” (Pv 22.28).
  • “Não respondas ao tolo segundo a sua estultícia; para que também não te faças semelhante a ele. Responde ao tolo segundo a sua estultícia, para que não seja sábio aos seus próprios olhos” (Pv 26.4,5).
  • “Porque os vivos sabem que hão de morrer, mas os mortos não sabem coisa nenhuma, nem tampouco terão eles recompensa, mas a sua memória fica entregue ao esquecimento” (Ec 9.5).
  • “E o pó volte à terra, como o era, e o espírito volte a Deus, que o deu” (Ec 12.7).
  • “Vós sois as minhas testemunhas, diz o Senhor, e meu servo, a quem escolhi; para que o saibais, e me creiais, e entendais que eu sou o mesmo, e que antes de mim deus nenhum se formou, e depois de mim nenhum haverá” (Is 43.10).
  • “Diante dele um fogo consome, e atrás dele uma chama abrasa; a terra diante dele é como o jardim do Éden, mas atrás dele um desolado deserto; sim, nada lhe escapará” (Jl 2.3).
  • “Não cuideis que vim trazer a paz à terra; não vim trazer paz, mas espada” (Mt 10.34).
  • “Mas Jesus lhe observou: Deixa aos mortos o enterrar os seus mortos; porém tu vai e anuncia o reino de Deus” (Lc 9.60).
  • “E disse-lhe Jesus: Em verdade te digo que hoje estarás comigo no Paraíso” (Lc 23.43).
  • “Jesus respondeu, e disse-lhe: Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus” (Jo 3.3).
  • “Jesus respondeu: Nem ele pecou nem seus pais; mas foi assim para que se manifestem nele as obras de Deus” (Jo 9.3).
  • “Ouvistes que eu vos disse: Vou, e venho para vós. Se me amásseis, certamente exultaríeis porque eu disse: Vou para o Pai; porque meu Pai é maior do que eu” (Jo 14.28).
  • “Se a obra de alguém se queimar, sofrerá detrimento; mas o tal será salvo, todavia como pelo fogo” (1Co 3.15).
  • “Dou graças ao meu Deus, porque falo mais línguas do que vós todos” (1Co 14.18).
  • “E também os que dormiram em Cristo estão perdidos” (1Co 15.18).
  • “Mas os seus sentidos foram endurecidos; porque até hoje o mesmo véu está por levantar na lição do velho testamento, o qual foi por Cristo abolido” (2Co 3.14).
  • “Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus. Não vem das obras, para que ninguém se glorie; Porque somos feitura sua, criados em Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus preparou para que andássemos nelas” (Ef 2.8-10) com “Assim também a fé, se não tiver as obras, é morta em si mesma. Mas dirá alguém: Tu tens a fé, e eu tenho as obras; mostra-me a tua fé sem as tuas obras, e eu te mostrarei a minha fé pelas minhas obras” (Tg 2.17,18).
  • “Que também, como uma verdadeira figura, agora vos salva, o batismo, não do despojamento da imundícia da carne, mas da indagação de uma boa consciência para com Deus, pela ressurreição de Jesus Cristo” (1Pe 3.19).
  • “Não ameis o mundo, nem o que no mundo há. Se alguém ama o mundo, o amor do Pai não está nele” (1Jo 2.15) com “Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3.16).
  • “Qualquer que é nascido de Deus não comete pecado; porque a sua semente permanece nele; e não pode pecar, porque é nascido de Deus” (1Jo 3.9).
  • “E, havendo o Cordeiro aberto um dos selos, olhei, e ouvi um dos quatro animais, que dizia como em voz de trovão: Vem, e vê. E olhei, e eis um cavalo branco; e o que estava assentado sobre ele tinha um arco; e foi-lhe dada uma coroa, e saiu vitorioso, e para vencer” (Ap 6.1,2) com “E vi o céu aberto, e eis um cavalo branco; e o que estava assentado sobre ele chama-se Fiel e Verdadeiro; e julga e peleja com justiça” (Ap 19.11).

3. A Bíblia, como Palavra de Deus, não possui contradições.

O que devemos fazer ante passagens que parecem contraditórias? Perguntar ao Autor (Lc 24.45; Jo 14.17,23,26); ler e reler o texto; levar em conta o contexto da passagem em análise (2Pe 1.20); permitir que a Bíblia interprete a si mesma.

4. O significado verdadeiro de cada passagem bíblica é o que o seu autor quis transmitir.

O estudo da história e das culturas dos povos antigos facilita na interpretação dos textos sagrados. Textos para constatação e aplicação desse princípio: Gn 24.2; Lc 10.4 e 2Jo 10; At 22.3,27,28; 1Co 11.21,33,34; 1Co 13.12; Tg 5.4; Ap 1.10.

5. As muitas figuras de linguagem contidas na Bíblia devem ser levadas em consideração, a fim de interpretar a Palavra de Deus corretamente.

As figuras de linguagem que mais ocorrem no texto sagrado são:

  • Metáfora: “Eu sou a porta; se alguém entrar por mim, salvar-se-á, e entrará, e sairá, e achará pastagens” (Jo 10.9). “Disse-lhe Jesus: Eu sou o caminho, e a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai, senão por mim” (Jo 14.6).
  • Sinédoque: “Temos achado que este homem é uma peste, e promotor de sedições entre todos os judeus, por todo o mundo; e o principal defensor da seita dos nazarenos” (At 24.5). “Se, na verdade, permanecerdes fundados e firmes na fé, e não vos moverdes da esperança do evangelho que tendes ouvido, o qual foi pregado a toda criatura que há debaixo do céu, e do qual eu, Paulo, estou feito ministro” (Cl 1.23).
  • Hipérbole: “Já estou cansado do meu gemido, toda a noite faço nadar a minha cama; molho o meu leito com as minhas lágrimas” (Sl 6.6). “Há, porém, ainda muitas outras coisas que Jesus fez; e se cada uma das quais fosse escrita, cuido que nem ainda o mundo todo poderia conter os livros que se escrevessem. Amém” (Jo 21.25).
  • Prosopopéia: “Os céus declaram a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra das suas mãos. Um dia faz declaração a outro dia, e uma noite mostra sabedoria a outra noite. Não há linguagem nem fala onde não se ouça a sua voz” (Sl 19.1-3). “Porque com alegria saireis, e em paz sereis guiados; os montes e os outeiros romperão em cântico diante de vós, e todas as árvores do campo baterão palmas” (Is 55.12).
  • Metonímia: “Disse-lhe Abraão: Têm Moisés e os profetas; ouçam-nos” (Lc 16.29). “Porque todas as vezes que comerdes este pão e beberdes este cálice anunciais a morte do Senhor, até que venha” (1Co 11.26).
  • Paradoxo: “Condutores cegos! que coais um mosquito e engolis um camelo” (Mt 23.24). “Porque é mais fácil entrar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no reino de Deus” (Lc 18.25).
  • Ironia: “Na verdade, vós sois o povo, e convosco morrerá a sabedoria” (Jó 12.2). “Porque penso que em nada fui inferior aos mais excelentes apóstolos” (2Co 11.5).

Pr. Ciro Sanches Zibordi (Semana Teológica, 2 e 3 de Dezembro de 2009)

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